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As conversas apresentadas têm caráter privado, protegidas pelo sigilo das comunicações, tratando-se, portanto, de interceptação telefônica, sem autorização judicial.
Os julgadores da Décima Turma do TRT-MG, por unanimidade, reconheceram a ilicitude de prova constituída por gravações e prints de conversas entre empregados, realizada por meio de aplicativo de rede social corporativa da própria empresa.
Foi acolhido o voto da relatora, desembargadora Ana Maria Amorim Rebouças, que reconheceu o caráter privado das conversas, concluindo que não podem ser utilizadas como prova em processo judicial, porque protegidas pelo sigilo das comunicações. Com esse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso da ex-empregada da empresa, mantendo sentença oriunda do juízo da 6ª Vara do Trabalho de Uberlândia/MG, nesse aspecto.
Entenda o caso
A trabalhadora não se conformava com a declaração de ilicitude da prova. Afirmou que os diálogos entre os colegas de trabalho provaram os atos de difamação que a ex-empregadora, uma empresa do ramo de tecnologia, teria feito contra a sua pessoa, que resultaram na sua dispensa sem justa causa. Acrescentou que as conversas são de “conhecimento público”, porque constam de escritura pública lavrada no Tabelionato de Notas de Miraporanga/MG, a pedido da própria empregadora e, dessa forma, deveriam ser analisadas no processo, ainda mais porque não contestadas pela empresa.
Interceptação telefônica – escuta telefônica – gravação clandestina
Ao expor os fundamentos da decisão e concluir pela ilicitude da prova, a relatora esclareceu a distinção entre interceptação telefônica, escuta telefônica e gravação clandestina:
“Na gravação clandestina, um dos interlocutores ou um terceiro, com ciência e autorização de um dos interlocutores, é quem grava a conversa”. Nesse caso, o STF tem entendido pela permissão de seu uso em processos judiciais como prova, eis que a hipótese não se confunde com a garantia constitucional de sigilo das comunicações telefônicas.
A interceptação telefônica é realizada por terceiro, sem o conhecimento de qualquer dos interlocutores.
“Na escuta telefônica, um dos dois interlocutores sabe que estão sendo gravados por um terceiro”, destacou.
Sigilo das comunicações X necessidade de autorização judicial
Segundo ressaltou a desembargadora, tanto a interceptação telefônica como a escuta precisam, necessariamente, de autorização judicial para que sejam consideradas provas lícitas, porque protegidas pelo sigilo das comunicações, estabelecido no artigo 5º, inciso XII, da Constituição, que dispõe: “É inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial (…). A violação do sigilo das comunicações, sem autorização dos interlocutores, é vedada, visto que a Constituição assegura o respeito à intimidade e à vida privada das pessoas, bem como o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas e telefônicas (artigo 5º, inciso XII, da CR/88)”, frisou a relatora. O entendimento adotado também se baseou no artigo 1º da Lei 9.296/1996, que, ao regulamentar o inciso XII do artigo 5º da Constituição, estabeleceu que a interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução de processo penal, dependerá de ordem do juiz competente para a ação principal, sob segredo de justiça.
Na decisão, foi pontuado que é lícita a gravação de conversa (ou gravação clandestina) realizada por um dos interlocutores, mesmo sem o conhecimento do outro, quando não existe causa legal de sigilo. Nesse caso, a gravação pode perfeitamente ser utilizada como prova em processo judicial. Entretanto, essa não é a situação retratada, tendo em vista que a ex-empregada não participou das conversas gravadas, as quais foram atribuídas a dois outros empregados da empresa. “Trata-se, portanto, de interceptação telefônica”, concluiu a relatora.
Conforme esclareceu a desembargadora, as conversas entre os colegas de trabalho da profissional têm cunho privado e não podem ser utilizadas como meio de prova, porque protegidas pelo sigilo das comunicações. “Constitui, portanto, prova ilícita, sendo vedada sua utilização em processo judicial do qual não fazem parte os interlocutores, sob pena de franca violação aos direitos de privacidade, de intimidade e de preservação da vida privada (artigo 5º, X, da CR/88)”, frisou.
A julgadora ainda ponderou que o fato de o diálogo se encontrar registrado em escritura pública não afasta a ilicitude da prova, tendo em vista que a obtenção inicial da prova ocorreu por meio ilícito, em transgressão a normas constitucionais.
Ausência de prejuízo
No voto condutor, também foi pontuado que o reconhecimento da ilicitude da prova não causou qualquer prejuízo processual à trabalhadora, o que apenas reforçou o entendimento de se manter a sentença recorrida. Isso porque, conforme apurado, o conteúdo nos diálogos interceptados não foi suficiente para evidenciar que a empresa praticou qualquer ato capaz de macular a honra e a boa fama da profissional, conforme ela havia alegado na ação. Até porque, como dito pela própria profissional, os diálogos apenas comprovariam o “ardil” feito por outros dois ex-empregados, com o intuito de provocar sua dispensa, e não eventual ilícito praticado pela empresa.
Danos morais não provados
A trabalhadora alegava que as conversas entre os ex-colegas de trabalho, objeto das gravações consideradas ilícitas, provariam que sua dispensa teve relação com o e-mail anônimo encaminhado pelos interlocutores contendo ofensas ao superior hierárquico. Mas as provas produzidas, inclusive a testemunhal, não confirmaram as afirmações da trabalhadora.
Contribuiu para o entendimento adotado na decisão o fato de a trabalhadora ter sido dispensada sem justa causa, o que ocorreu após um mês da dispensa dos autores do e-mail em questão, inexistindo indícios de que a trabalhadora foi dispensada pelos mesmos motivos.
Para a julgadora, a trabalhadora não se desincumbiu do ônus de comprovar qualquer nexo causal entre o dano – sua dispensa – e quaisquer atos omissivos ou comissivos da empresa resultantes da apuração da autoria do ato ilícito perpetrado por outros empregados. Ela entendeu, portanto, que não ficaram caracterizados os fundamentos para se imputar a prática de dano moral por parte da empresa. A decisão foi acompanhada pelos demais julgadores do colegiado. Atualmente, o processo aguarda decisão de admissibilidade do recurso de revista.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região